sobre um coração partido
Há muitos anos que estou num caminho para curar o que quebrei com chicotadas autoflageladas demasiado profundas para a sensibilidade da minha alma. Quando percebi que iria finalmente começar a lutar por mim mesma aceitei que iria ser a batalha mais difícil da minha vida. E é efetivamente a coisa mais corajosa e dolorosa que fiz. Começar a afagar as cicatrizes em vez de pôr o dedo na ferida é estranho. É desconfortável para mim abraçar-me da mesma forma que abraço o mundo. Mas estou a fazê-lo, aos poucos. Estou a levantar-me e a fazer o trabalho sujo porque mereço ser minha amiga.
E esse amor tem sido a cola para os pedacinhos que caíram e para outros que fui encontrando. Já não estou tão despedaçada, no mar de almas quebradas que somos.
Mas às vezes eu não sou a minha única inimiga. E passei estes anos todos a cuidar tanto da minha alma, que deixei desprotegido o coração. E se a alma era sensível, o meu coração é puro cristal. E quando este parte ao mesmo tempo que a alma, deixo de conseguir respirar. E torna-se avassalador para uma mera bob construtora em formação.
Convenci-me de que o processo de renovação do coração é automático como o de todas as outras células e que se o ignorasse, não seria realmente importante se ele estivesse despedaçado. Porque, afinal, não há tantas coisas mais importantes que um coração partido?
Aparentemente, o meu está tão magoado, que os estilhaços perfuraram os outros órgãos. E só vejo sangue e lágrimas e a esperança que ousou nascer onde sabia ser infértil. Estou despedaçada. Estou de luto por tudo o que não foi e que eu desejei aos dentes de leão que fosse. Estou ainda a questionar-me como posso aprender a amar-me num mundo que não me ama. Estou a sufocar-me em tristeza não atendida. Estou de rastos, num rastejo impossível para me manter em movimento.
Como se cura um coração partido? Como se sossega um coração que grita para ser amado, com uma necessidade desse amor como do sangue que bombeia. Estou há tanto tempo a estancar uma ferida que se calhar provém da hemorragia interna que fingi não ter.
Parece que o caminho que me esforcei tanto para calcar foi em vão. Talvez o amor próprio não seja suficiente, desta vez, por mais que eu precise que seja.
Dói muito. Dói mesmo muito. Mas se o meu coração me ensinou a sentir com todos os nervos que me inervam e enervam, também me ensinou a ter esperança, mesmo quando intensifica o golpe severo dos dois gumes. A verdade é que ele ainda bate, mesmo depois de tudo por que passou às mãos do mundo, que desde sempre que o tem em luvas escorregadias.
E se ele ainda bate, então ainda tenho o que amar. E é sobre isso. Sobre amar. Foi sempre sobre isso. Sobre um coração partido que nunca desaprendeu a amar.
Até à próxima página,
Desbookada

Tens um coração muito bonito, Desbookada. Obrigada por mo teres mostrado sempre, e por o dares ao mundo todos os dias sem esperar nada em troca. Mereces de volta tudo isso, multiplicado por mil. Nada me faz tão feliz como saber que, por fim, esses dias estão a chegar.
ResponderEliminarUm brinde ao teu coração ❤️